As quizilas, as réplicas e tréplicas inerentes ao pathos convivial — contraparte necessária ao pathos da distância constitutivo da linguagem da poesia — nos condenam a uma atitude de análise em que o importante é nos sentirmos implicados quer nos logros, quer nas pertinências que denunciamos.

terça-feira, 31 de março de 2009

conversando sobre haikai em santa rosa / RS


O haikai tal como agora o conhecemos é algo “fora-do-lugar”; é um gênero transculturado. Isto é, o haikai é uma invenção, no sentido em que era inexistente ou parecia ser impossível e impensável em português ou em qualquer outro idioma que não o japonês. E, como invenção, o que importa, hoje, é a margem de liberdade com que trabalha o poeta na re-acomodação dos seus dados visando à criação original.

Portanto, sua reencarnação ou aclimatação em terras estrangeiras, nos permite aceitar tanto haikais mais reverentes ao “espírito” tradicional, quanto outros, digamos assim, mais miscigenados, impuros. Neste rol, entram também os poemas breves, e a este propósito os poemas de Oswald de Andrade, p.ex., têm por assim dizer uma certa consangüinidade com a poética da brevidade do haikai.

Os grandes artistas e pensadores nos fazem acreditar em suas ilusões e perplexidades, fazem-nas possíveis, plausíveis para a nossa sensibilidade. E muitas dessas ilusões orientam as nossas visões de mundo e nossas ações sobre ele.

Pois bem, embora eu não seja um desses grandes artistas, vou tentar fazer com que uma das minhas ilusões pareça plausível, ou no mínimo tolerável, ao menos para alguns leitores e internautas (que são coisas diferentes).

Minha tese/ilusão é a seguinte: o haikai está para a poesia assim como a poesia está para a literatura. São coisas diversas, com semióticas particulares.

O haikai não é bem poesia, embora possa ser enfiado, não sem algum esforço, no escaninho, na tradição do gênero lírico.

Poesia não é bem literatura, embora também tenha sido acolhida por uma visão escolástica consagrada pelo tempo que concebe o literário na perspectiva do deleitar que educa e enobrece o espírito. Mas aí, mesmo, poderíamos sublinhar um desvio de rota operado pela poesia em relação à literatura: esta é mais rente ao utilitarismo semântico; por outro lado, aquela (a poesia) sugere os seus sentidos antes pelas relações musicais-espaciais entretecidas em seu discurso do que por uma necessidade supostamente elevada de dizer ou de ensinar. Alguém já definiu a poesia como “beleza inútil”. A beleza não precisa de justificativa. O signo estético é intraduzível.


ronald augusto

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