signagem

As quizilas, as réplicas e tréplicas inerentes ao pathos convivial — contraparte necessária ao pathos da distância constitutivo da linguagem da poesia — nos condenam a uma atitude de análise em que o importante é nos sentirmos implicados quer nos logros, quer nas pertinências que denunciamos.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

esboço




Em determinado ponto do áspero cercado vislumbrou a chance de escapar. Considerou a ocasião. E se minhas pernas, se minha musculatura não escultural, se meu fôlego, se esses recursos todos falharem? De surpreender será o pleno desempenho do conjunto. Quase invocava um revés, mas isso em seu íntimo, sem dar na vista e para que os demais não fraquejassem. O custo da culpa; o recurso à culpa. O ato intolerável que o conduzira a tal confinamento finava com as suas forças.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

sábado, 23 de abril de 2011

domingo, 17 de abril de 2011

tudo se resume a uma



quase circunstância.


Cândido Rolim

sábado, 16 de abril de 2011

domingo, 20 de março de 2011

durável estranheza



A leitura assemelha-se a uma operação de acercamento, tateio, aproximação, insinuação criativa. Não há a leitura última ou única do texto.

Mas essa esquiva (detonada pelo esforço plástico do autor e em parte atribuível a seu repertório) não pode (ou pelo menos não deveria) ser tomada pelo autor como um triunfo, uma epigonia consagradora.

O projeto do texto furtar-se, a todo custo, a uma apreensão “rasa” pode, por outro ângulo, cair no esnobismo ou mistificação da dificuldade, esgotando-o ou plasmando-o em instituição a meio caminho de onde ele, em potência, poderia chegar ou, melhor, partir.

Não se deve esquecer que a malha do impasse textual é ainda porosa e tecida com elementos minimamente comuns a leitor e autor, a ponto de se permitir prever um horizonte de intriga onde, em tese, seria possível haver, senão a coincidência, pelo menos a mútua reinvenção, a estranheza durável.

Cândido Rolim

domingo, 23 de janeiro de 2011

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

um lugar para dançar (*)

É comum dizer-se que a dança faz-se. Mas há que desbastar, na floresta de signos gestuais desenhados pelo indivíduo, a disciplina instantânea desfrutada pelo próprio corpo para conduzir-se rumo a um emaranhado de desejos: pode ser um lugar, mas pode ser também uma idéia fixa.





Cândido Rolim



(*) imagens e textos partem de um comentário feito pelo poeta Eduardo Jorge, acerca de uma fotografia.

domingo, 14 de novembro de 2010

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

anacronia do drible


o jogo, as apostas, dão-se a meio caminho do que pode acontecer. o jogo, no fundo, nega a fruição do desfecho; sonega um derradeiro gesto. o melhor e mais eficaz contendor talvez seja aquele que ignora o desfecho, aquele que concentra toda sua energia numa tarefa situada entre a aposta e o resultado, que se realiza – se o acaso permitir, no entretempo, no interstício.

espera-se um resultado, mas não diviniza o triunfo em si (do contrário, permitir-se-ia desistir). “um bom drible vale mais que o gol”, diz o boleiro. o drible difere o êxito, podendo, no entanto, resultar em torná-lo mais notável, pela simples proximidade de um arranjo anárquico, súbito. exemplo: Garrincha, seu capricho gratuito, desmesurado, contraproducente às vezes. em visada a seu itinerário obsessivo em mínima faixa do campo, parece que segue o “caminho que não leva a lugar nenhum” (o Holzwege, de Heidegger), ou os seus “caminhos florestais”, lembrados por Hannah Arendt.

a agudeza irresponsável do drible desborda a tática, eviscera a parcimônia do projeto-disputa, quase como um elemento de fanfarronice. mas observando as performances de atletas ao longo da história – Mário Sérgio, Lionel Messi, Pelé, Zinedine Zidane - perguntas do tipo “Garricha jogaria hoje? Garrincha faria o que fez com o tipo de marcação atual?” pedem uma resposta reticente, mas sem grande margem para equívoco: provavelmente sim.

no entanto, o drible como um corte paratático, de meta só aparentemente identificável, que tem o gol como eventualidade, por não se sujeitar a um aperfeiçoamento programado e baseado em scouts - essa performance parece reeditável, em qualquer tempo.

e isso se deve, ao que tudo indica, porque o drible parece nascer de uma dobra anárquica do esforço, uma enteléquia infiltrada na evolução dos movimentos do atleta, quase esnobando da predestinação apolínea dos músculos. daí sua projeção instantânea surpreender o cálculo producente do defensor: é possível perceber que o habilidoso atacante deixou atrás de si destroços de um metódico e disciplinado (agora angustiado) projeto de contenção. afinal, parece que nada conseguiu abortar a fuga subversiva (álacre manobra entre 2 ou mais pontos), contrária a seu domínio.

Cândido Rolim

Em vídeo no Youtube:

http://www.youtube.com/watch?v=yvT6Br8A7Uo

domingo, 7 de novembro de 2010

cinema catastrófico





no cinema de catástrofe, pelo menos em relação aos produtos mais conhecidas na indústria de Hollywood, a natureza das cenas, a platitude dos diálogos, tudo permanece fiel a um standard que não abala nem desarticula o horizonte de uma realidade excessivamente amena.

tem-se a idéia de que tudo sempre se aproxima de mais um rotineiro roteiro de filme de ação, em que se destaca a figura de um personagem absurdamente invulnerável, agora agitado aqui acolá por tremores de terra, meteoros, tempestades de areia ou seres devastadores, close de maquetes tombadas sob ondas fictícias de oceanos alterados, pessoas em rota de colisão com seu cotidiano, sob o encalço de automóveis desgovernados.

os personagens – notadamente a figura de um presidente ou um executivo que tem sempre as rédeas da situação – atravessam as cenas com tal indiferença e gracejo que esse realismo postiço acaba por dissolver as circunstâncias trágicas de fundo.

em resumo: nos filmes de catástrofe, esta não é seguramente a personagem principal. e, ainda, o drama, por mais terrível e incontrolável, ainda que leve a termo raças e espécies, nunca será bastante para livrar o espectador de um passeio inevitável por diálogos e situações bisonhas, melodramas e piadas tão inócuas quanto inadequadas para o pathos agonístico da trama.

Cândido Rolim

sábado, 30 de outubro de 2010

terça-feira, 28 de setembro de 2010

um delírio fake do prestígio

na carona desse gesto contido na “suzuki de pobre” percebo menos uma frustração que uma personalização fantasmática que coloca o indivíduo, de certa forma, na poeira de um delírio a que estão sujeitos todos os que mentalizam os signos da distinção.
é comum, às margens do alto consumo, encontrarmos gestos a meio termo entre desdém obsessivo e escárnio em relação aos modelos postos em evidência, visto aqui como elementos indicadores de projeção (a grife).
a forma do objeto, quanto menos sua funcionalidade, é especularmente reproduzida, pirateada, reinventada a ponto de, paradoxalmente, sub-servir a um zelo fetichista de um design soberbo, cobiçável em si mesmo. simplório e opaco em suas funções essenciais, o objeto submete-se a um improviso jocoso, uma invenção ridente de si e do meio em que trafega anônimo, silencioso e invisível. ele é agora elevado à condição de produto fantasmático da marca.
de fato, um personalismo capenga, periférico, re-desenha os signos do éden socialmente cobiçável em sua lataria, onde se assentam os tipos da distinção corroída: fabulação do objeto-sonho de aquisição.
mas esse objeto, propositalmente desgarrado de sua forma útil/utilizável e investido graciosamente na ambígua função de homenagear e corroer graciosamente a rigidez sublime, quase sacra, da marca registrada, não já estaria antes dissolvido por uma saturação hipertrofiada do padrão, pela “abstração inacessível do modelo (Jean Baudrillard)”, às margens mesmas da produção e do alto consumo?

Em vídeo:
http://www.youtube.com/watch?v=09B72zdeHY4

Cândido Rolim

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

domingo, 29 de agosto de 2010

terça-feira, 17 de agosto de 2010

machado tuitando



Mínimo canal semiótico para as truncadas falas do ego entre lúdico e engajado num debate sem centro visível, o limite de 140 caracteres para a mensagem impõe uma contenção compulsória na informação, proporcionando também interessantes demolições no processo semântico – tiro à queima-roupa na falácia, um convite à conexão-reflexo.
Além disso, esse fluxo de atualizações instantâneas permite jogos, cortes aleatórios, interlocuções improváveis no tempo e no espaço, apropriações acobertadas pelo conforto do anonimato.
Imagino, por exemplo, num deslo(u)camento temporal, Machado de Assis tuitando com alguns seguidores, sem tempo e lugar preciso. Vocábulos e frases retiradas de crônicas de 1876 a 1878 que, em distorcido contexto, concedem à mensagem um atrito anacrônico, uma outra pulsação.

Cândido Rolim

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

segunda-feira, 19 de julho de 2010

hollywood, um take


entre recomendações fúteis e trejeitos submissos, a balbuciante mulher escorrega as mãos longas e alvas por trás dos músculos do herói em camiseta colada ao corpo, abstraído em uma gama de objetos votados a retroalimentar suas forças de homem que centraliza as ações.
é verdade que a tez confrangida dele denuncia uma retidão hipertrofiada de guardião de algum valor que suplanta todo o entorno – resíduos exaustos da supremacia, como se fosse insistentemente molestado por uma preocupação clássica, ecumênica, quem sabe um interesse repentino pelo mundo (liberdade, democracia, missões humanitárias, morte de um tirano, resgate do amigo da corporação...).
tudo invariavelmente seguido de um gesto em abandono: sorver uma caixa de leite, acender displicentemente um cigarro, servir um drinque, jogar a chave do carro sobre o cinzeiro ou atirar-se no sofá empunhando o controle remoto.
novamente é possível ouvir a voz da mulher, que retorna à cena. agora seu corpo, destaque para a intensa pintura das unhas e dos lábios – um relevo não desprezível da volúpia doméstica - cumpre a função de trazer o protagonista para o palco das boas intenções recompensadas, proporcionando, enfim, algo que ilustre ainda mais sua moral predominante e, de quebra, forneça um pouco de argila para compor o mito.

Cândido Rolim


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