As quizilas, as réplicas e tréplicas inerentes ao pathos convivial — contraparte necessária ao pathos da distância constitutivo da linguagem da poesia — nos condenam a uma atitude de análise em que o importante é nos sentirmos implicados quer nos logros, quer nas pertinências que denunciamos.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

fluidos de um amargo sal


Diante de uma poesia que não esconda sua vocação para a fúria e a transgressão, muito além de um mero decalque elegante do entorno árduo que envolve o autor, é possível que ainda se cobre deste um maior comprometimento com “o que lhe é próprio” ou uma coerência discursiva, algo que o livre de “não ser somente um militante altissonante da causa”. Coisas do gênero.
Mas, antes de qualquer coisa, vale lembrar que nem sempre a poesia quer comover-se com somente falar de si, sob pena de extrema deslealdade com o que se quer, bem ou mal, dar a pensar, sentir, contra/dizer.
Em textos poéticos “de combate”, tudo leva a crer que os elementos semânticos e sintáticos sejam mais ou menos alinhados com as circunstâncias ideológicas, quanto mais enredados estes estejam na trama sígnica. Mas, convenhamos, seja de que assunto trate, dificilmente um poema se compraz em figurar como componente irredutível de uma convicção.
Cito como base a escrita de Adão Ventura, poeta morto em 2004. Para onde o leitor se desloque na superfície suspeita do texto, que tampouco se esgota no discurso afiançado pelos insumos etno/gráficos, não há divisórias claras entre imagem e mensagem.
Aqui, agitada pela linguagem, a bandeira pele é percutida por uma raiva contida e continente, ênfase esfaceladora e atordoante de um balbucio-fala de arremedo, de triturante intenção mandibular. A boca como sede de expressão e ataque.
A propósito, qual a ginga adequada e eficaz para saltar sobre a paliçada erguida na pele, enquanto aqui fora rola um pálido debate acadêmico entre críticos e poetas acerca de a que mundo se refere o texto poético? A poesia de Adão Ventura, feita de dísticos breves e contundentes, sem lamúria, lança-se feroz sobre os adágios cínicos da história. Dois exemplos:

Fábula

Engolir sapo seco
ou vestir a camisa
dos camaleões.

Engolir sapo seco
por qualquer traste
ou migalha.

Engolir sapo seco
ao sabor do esterco
e da farsa.

Engolir sapo seco
ou mijar
pelas pernas abaixo.

Engolir sapo seco
ao invés
de sangrar os porcos.


Dar nome aos bois

Dar nome aos bois,
apartá-los em mangas privilegiadas
- de preferência com capins
de fios de ouro
ou prata.

- Isolando-os da ralé dos bois de
corte.


Cândido Rolim

2 comentários:

  1. cândido:
    o tião nunes dispõe de um vasto material do adão
    ventura.
    um abraço.
    romério

    ResponderExcluir
  2. Cândido, como vão as coisas ai pelas bandas desta cidade da luz, conhecida por fortaleza de nossa senhora da assunção? tchê,eu sou o Demetrius Câmara, percussionista e participo do projeto musical com seu irmão tom gil e também estou trabalhando em meu blog:demetriuspercussionista.blogspot.com e gostaria de convida-lo a conhecer o blog e também indica-lo em seu links, vou fazer o mesmo em relação a seu blog, tudo bem?
    um abraço.
    Demetrius Câmara

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